Áreas invadidas próximas às ferrovias criam obstáculos para retomada do modal no estado

Crédito: Rogério da Silva

Recolocar o transporte de carga por ferrovias de volta ao seu devido lugar com eficiência no Rio Grande do Sul se transformou em um enorme problema e, sobretudo, demorado. Áreas próximas aos trilhos foram invadidas, nas duas margens, ao longo das duas últimas décadas. Há residências, galpões e lavouras. Em alguns casos, as prefeituras já cobram o IPTU. “A empresa que detinha a concessão foi relapsa e agora se criou um enorme problema, onde os trens não podem mais circular com segurança”, alerta Luis Fernando Fucks, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja no Rio Grande do Sul (Aprosoja-RS), se referindo a ALL, que assumiu o controle em 1997.

Para ele, novos trechos precisarão ser construídos para contornar as zonas urbanas ocupadas de forma irregular, na medida em que a restituição das margens promete ser um processo lento. “Deverá ser considerado qual o melhor procedimento para viabilizar o transporte ferroviário e sobretudo, quem prevaricou”, diz Fucks. Ele desconhece o número de número de locomotivas e vagões em operação hoje, mas assinala: “Pelo que tenho visto ao transitar pelos modais ainda ativos, parece que toda a sucata que tinha pelo Brasil afora, foi destinada para o transporte aqui no estado”.

Modelo de concessão viciado

Ele defende um novo modelo de concessão. “O grande problema foi entregar a malha a quem não tinha a menor intenção de viabilizá-lo. Se fala em reativação, mas em um processo que seria conduzido pelos mesmos atores. Além disso, não há sentido nenhum em conceder a malha ferroviária a quem irá explorá-la com a frota. É uma distorção que não vê em outros países. Viciado desde o início, este modelo não trará eficiência no que diz respeito ao transporte e ao custo. Como está hoje, será apenas a troca de um modo pelo outro, sem competitividade”, observa.

Fucks entende que o transporte ferroviário é viável para longas distancias, enquanto o rodoviário é para atender o deslocamento até os pontos de transbordo. “Qualquer coisa fora disso não nos serve. O modelo americano, com direito de passagem parece ser o mais adequado. O que temos no Brasil é algo inaceitável e fruto daquilo que chamamos de corrupção. É o descaso com a coisa pública e o resultado das relações de compadrio que contaminam os poderes, quando os interesses corporativos utilizam o governo com repartição”, se indigna.

Custo adicional para o produtor

Segundo ele, se não há eficiência e tampouco disponibilidade do serviço de fretes entre a zona de produção e o porto de Rio Grande, e vice-versa, a responsabilidade é da concessionária, ressalta. “Terminais para carregamento de grãos foram construídos e outros reformados para utilização da via férrea, mas não houve oferta de fretes pela concessionária. O que a ALL vinha fazendo até o momento era um grande jogo de cena, dando sinais falsos de que iria reativar o transporte toda vez que o Ministério Público a pressionava a cumprir o contrato”, conta o dirigente.

Valdir José Nunes Santana Marques, dono da Grão Fortte, corretora de grãos, de Ibirubá (norte do estado) não esconde a indignação: “É uma vergonha o que aconteceu com a malha desde a privatização”, diz o empresário do alto dos seus mais de trinta anos nessa área. Segundo ele, as cargas de soja que ainda utilizam as ferrovias para o escoamento estão concentradas nas cidades de Cruz Alta, Cacequi e Santo Ângelo. “A falta de trens impacta diretamente no produtor. O tabelamento do frete rodoviário trouxe um custo adicional de 4 a 5 reais”, diz Marques.

Privatização e sucateamento

No início da cultura da soja no Rio Grande do Sul, nos 1960, a produção de cerca de 1,0 milhão de tonelada era majoritariamente escoada por ferrovia. O modal foi fundamental na expansão do grão, pois não haviam meios de escoamento pavimentados. Até mesmo o deslocamento de pequenos depósitos até os terminais eram complicado. O recuo se deu a partir de 1995, dois anos antes do processo de concessões da malha à iniciativa privada. Atualmente, os trens respondem por menos de ¼ do transporte das 18 milhões de toneladas do grão.

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