Uma nova entidade começa a ser formada para representar o setor eólico offshore no Brasil. Com o objetivo de unir as partes interessadas em acelerar, simplificar e reduzir o custo de implantação de eólicas offshore — marítimas, lacustres, em rios, vazantes — no país, está sendo criada a Associação Brasileira de Eólicas Marítimas (Abemar). Marcelo Storrer presidente do conselho de administração da Abemar, que está em fase final de elaboração de seus estatutos, afirmou à Modal que a entidade pretende se constituir como órgão de referência de eólicas offshore no Brasil.
Segundo ele, a Associação Brasileira de Energia Eólica (ABeeólica), que congrega e representa a indústria de energia eólica no país, não representa a eólica offshore por defender interesses conflitantes. “Sua prioridade é desovar o estoque de projetos eólicos terrestres e deixar o offshore para após 2030. Nós queremos offshore agora”, enfatiza Storrer, que também atua como CEO da Eólica Brasil Ltda e da Usina Asa Branca Participações Ltda.
Uma das primeiras ações da Abemar é um substitutivo ao PLS 484/17 (PL 11.247/18) para impedir que seja aprovado o seu texto original. Storrer argumenta que o referido projeto de autoria do senador Fernando Collor Melo, que uma vez aprovado, “mataria a livre iniciativa, favoreceria as petroleiras e visaria matar os projetos em curso de eólicas offshore sem autorização, desconsiderando por completo todo o investimento já feito”.
A seguir, leia os melhores trechos de sua entrevista à Modal:
Qual a situação do Brasil em termos de tecnologia offshore? O Brasil é um dos líderes mundiais em tecnologias de grandes projetos offshore, oriundas da exploração e produção de petróleo no mar. Várias dessas tecnologias são relacionadas e aplicadas nos projetos das eólicas offshore, principalmente no se refere à engenharia das estruturas, fundações, construção e execução de projetos no mar. Também somos referência em tecnologias associadas à distribuição, transmissão e integração da energia gerada a nossa rede. Temos um parque industrial com capacitação em muitos dos equipamentos que serão utilizados. Como os grandes parques eólicos offshore estão na Europa, estamos trabalhando com as companhias europeias para incorporar ao nosso projeto à tecnologia estado-da-arte existente por lá, como as turbinas de nova geração com 12MW de capacidade, em fundações especiais para essas grandes turbinas e nas logísticas de execução de projeto.
O que é necessário para a execução de projetos eficientes? Para executar os projetos eficientemente, precisamos construir portos com resistência acima de 15 toneladas/m2, atualmente inexistentes no Brasil. Inexistem embarcações de instalação de fundações e turbinas eólicas marítimas no Brasil. Por isso, trabalhamos com as companhias europeias especializadas no setor.
Quais as diferenças entre as infraestruturas de instalação offshore e onshore. A tecnologia offshore não é muito mais cara? A offshore não precisa construir estradas, não precisa desmatar, não precisa rebaixar lençóis freáticos, não precisa remover casas. O canteiro de obras de uma eólica offshore é um porto, longe do local da usina. As offshore marítimas são instaladas por balsas auto elevatórias tipo jack-up, por embarcações instaladoras de cabos e por embarcações instaladoras de pedra para enrocamento em volta das fundações. Os cabos elétricos submarinos são enterrados no leito marinho a uma profundidade entre 2 a 5 m. A operação e manutenção preventivas são feitas por pessoal transportado por lanchas rápidas de transporte de pessoal e também por helicópteros, quando as usinas são mais longe da costa e o mar com ondas mais altas.
Qual o comparativo do CAPEX/MW entre as duas tecnologias? Existe cenário de viabilidade econômica de médio prazo para esta tecnologia ser adotada no Brasil, para 2023/2024. O custo de instalação da tecnologia offshore ainda é mais cara por MW, por potência instalada, mas, devido ao porte muito maior das turbinas eólicas marítimas que as terrestres, estudos já concluíram que o custo da energia gerada (MWh) hoje passa a ser menor que o das eólicas terrestres, a partir de uma potência instalada em torno de 700 MW, com turbinas de potência superior a 10 MW. Na Europa, contudo, o custo por MW instalado caiu a ponto de ser competitivo sem a necessidade de subsídios, com as turbinas de 9,5 MW vendidas em 2018, e para instalação em 2022. Nesse caso o custo por MWh caiu para menos da metade comparado ao preço de 2016, apenas dois anos antes.
Quais os cenários que vislumbra para a energia eólica offshore no país? O cenário otimista? Em 2022 são entregues o Terminal Portuário de Uso Privado no Pecém e a embarcação especial de instalação de turbinas eólicas marítimas. Em 2022 inicia-se a implantação do Complexo Eólico Asa Branca I – 720 MW. A Abemar propõe e o governo federal consegue retirar travas do ordenamento jurídico regulatório que encarecem, burocratizam, atrasam e dificultam a implantação. Com isso, haverá uma corrida de agentes privados no litoral norte do Brasil, onde, a uma profundidade entre 10 e 50m, é possível instalar 30 usinas de Itaipu apenas com eólicas marítimas. Com a tecnologia atual e a preços que no Brasil serão competitivos após a instalação de aproximadamente 3 GW, com instalação de infraestrutura portuária apropriada e a construção de embarcações de instalação de turbinas, cabos e pedras.
Cenário realista?
Implantação do Terminal Portuário de Uso Privado no Pecém em 2023. Embarcação especial de instalação de turbinas eólicas marítimas concluída em 2023. Instala-se o Complexo Asa Branca I até o final de 2024. Mantém-se o atual regime de autorização para a produção independente de energia elétrica de fonte eólica e a cessão em condições especiais de imóveis da União no mar, mediante inexigibilidade de licitação por ausência de condições de competitividade, pelo fato de a Aneel apenas poder autorizar uma empresa a construir e operar uma usina eólica em um imóvel no mar. E não duas.
Cenário pessimista? É aprovado o PL 11.247/18. Com isso, se estatizaria a iniciativa de estudar, desenvolver e escolher áreas no mar. Tentariam matar os projetos privados existentes, atrasariam a implantação, acabaria o regime de autorização, passaria a haver o regime de concessão mediante licitação e o mercado passaria a depender das iniciativas da Petrobrás e do governo federal, o que poderia gerar um monopólio temporário entre a estatal e a Equinor. Isso atrasaria o mercado e o fluxo do pipeline de projetos, impossibilitando a livre iniciativa no setor. Em consequência, o Complexo Asa Branca atrasaria a sua construção. Estaria afastado o cidadão brasileiro do setor. Termoelétricas poluentes tomariam o natural lugar das eólicas marítimas. O Brasil descumpriria o Acordo de Paris