O monstro do GSF e a assimetria de risco para os pequenos geradores

Por Daniel Faller (*)

Desde 2014 os geradores de energia hídrica que integram o Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) vêm sofrendo significativas perdas financeiras em razão dos efeitos do ajuste mensal de garantia física, dado pelo menor volume de geração dessas usinas frente a sua garantia física.

A medida que o problema tomou um volume mais expressivo, os agentes começaram a pleitear na Justiça uma limitação para os efeitos desse ajuste mensal, conhecido como GSF, e conforme as ações obtiveram êxito a conta passou a ser dividida entre os agentes que não tinham obtido liminares, obrigando estes a ingressar com ações para evitar o pagamento de uma conta que não lhes pertencia. Assim, o mercado de energia passou a ser regido por determinações judiciais e não mais por suas regras.

A verdade é que a negligência do governo diante de tal problema transformou o GSF em um monstro capaz de desestabilizar um dos pilares da economia brasileira. Em vez de atuar fortemente na causa, o foco foi resolver os efeitos e a saída encontrada, em 2015, foi transferir o risco hidrológico para o consumidor.

A Lei nº 13.203 de 2015 trouxe a possibilidade dos geradores repactuarem o risco hidrológico, porém tal condição só era vantajosa aos agentes que haviam comercializado energia no Ambiente de Contratação Regulado (ACR), uma vez que estes pagariam um prêmio de seguro para transferir o risco ao consumidor cativo e reduzir a sua exposição ao GSF.

Ocorre que a parcela dos geradores que tinha energia comercializada no ambiente livre continuou exposta a um GSF cada vez maior, principalmente os pequenos geradores (PCHs e CGHs) que sofreram efeitos financeiros muito grandes.
Quando avaliamos o histórico desde 2013, observamos que a partir de 2016 temos uma mudança muito expressiva no comportamento do GSF, sendo que tal situação foi gerada por uma sazonalização acentuada feita pelos grandes geradores que buscaram um deslocamento financeiro da energia para os momentos onde o PLD tende a estar mais elevado.

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Essa sazonalização descabida agravou muito os efeitos financeiros para os pequenos geradores que não têm qualquer capacidade de gestão dentro do MRE, salvo tentar “copiar” a curva de sazonalização dos grandes geradores para tentar reduzir o impacto financeiro.

O fato é que toda essa questão com o GSF trouxe aos pequenos geradores a necessidade de gestão de um problema que não é oriundo exclusivamente do risco hidrológico, associado ainda a falta de vontade política de resolução da causa do problema.

Os agentes que comercializaram energia no Mercado Livre e consequentemente não conseguiram repactuar o risco hidrológico, perderam entre 20 a 25% de sua receita nominal nos últimos de seis anos. Quando os números são avaliados no mês a mês, não são raros os casos onde a receita foi inferior a 10% da nominal dado o grande volume de exposição em momentos com o PLD próximo do seu limite superior.

O projeto de Lei 10.985, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados, é a mais recente tentativa de reestabelecer uma condição de equilíbrio ao MRE, porém fica longe de atender as expectativas dos pequenos geradores, em especial das CGHs.

Em termos práticos, isso significa que os pequenos geradores seguem “administrando” o prejuízo e sem uma perspectiva de resolução para o passado e muito menos para o futuro. É claro para todos que a colcha de retalhos criada é uma medida paliativa e que se não atacarmos o cerne da questão o “monstro do GSF” continuará assombrando o mercado.

Algumas medidas para correção das distorções são muito simples e poderiam ser ajustadas de pronto, como, por exemplo, a limitação da sazonalização de garantia física, já o problema principal do MRE, que é a superestimativa de Garantia Física das usinas, tende a ficar sem solução no curto prazo.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já deixou claro que atuar na revisão de Garantia Física nesse momento gerará prejuízos enormes às empresas do grupo Eletrobrás, talvez até inviabilizando sua privatização. Por hora nos resta torcer por ações eficazes que resolvam o futuro, afinal de contas existe muito mais futuro do que passado…

(*) Diretor da HydroFall Consultoria Ltda.

 

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